O cisto do ducto nasopalatino é um cisto não odontogênico de desenvolvimento, derivado de remanescentes epiteliais presentes no interior do canal nasopalatino. O canal nasopalatino ou incisivo é um conduto intraósseo que serve para passagem do nervo nasopalatino e os vasos esfenopalatinos.  Esse canal começa nas fossas nasais, com os forames nasais (ou de Stenson), dispostos bilateralmente aos septos nasais e termina na cavidade oral, na fossa incisiva, atrás dos incisivos centrais superiores. Como o canal, na porção nasal, é bilateral, ele tem o formato em “Y” ou “V”. Alguns indivíduos podem apresentar canais únicos (não duplicados) ou duplos, que não se encontram ao longo do seu trajeto até a cavidade oral.

Em humanos, o ducto nasopalatino é uma estrutura vestigial, atrófica e sem função fisiológica evidente. Essa estrutura está localizada no interior do canal nasopalatino, onde tende a se fragmentar, deixando remanescentes epiteliais. Os estímulos que levam à proliferação e formação do cisto são desconhecidos. Para alguns autores, quando o cisto ocorre próximo a abertura na cavidade bucal, ele recebe o nome de cisto da papila incisiva ou palatina.

Até recentemente, os cistos localizados na porção posterior da rafe palatina eram chamados de cisto palatino mediano. De acordo com essa teoria, esses cistos poderiam se originar de remanescentes epiteliais aprisionados durante a fusão dos processos palatinos no período embrionário. Entretanto, esses remanescentes retidos apresentam localização extraóssea e dão origem às Pérolas de Epstein, que são cistos localizados próximos da mucosa e com conteúdo de queratina. Como o cisto palatino mediano não é queratinizado e, por vezes, apresenta revestimento epitelial do tipo pseudoestratificado, com vasos e nervos na cápsula, a hipótese mais provável é que ele seja um cisto do ducto nasopalatino em uma localização mais posterior do palato.

 

Características clínicas

O cisto do ducto nasopalatino é considerado o cisto não-odontogênico mais comum na cavidade oral. Estudos conduzidos em crânio seco, de cadáveres, mostram que a sua prevalência é aproximadamente 1%. Esse cisto ocorre mais em homens entre a terceira e sexta décadas de vida. Clinicamente, o sintoma mais comum é a tumefação na região anterior do palato (Figura 1). Em razão de infecção secundária, em alguns casos, pode haver dor ou drenagem de coleção purulenta ou de material mucoide de sabor salgado. Testes de sensibilidade pulpar são necessários para o diagnóstico diferencial com o cisto radicular. Como a capacidade proliferativa do revestimento epitelial é limitada, a lesão pode permanecer assintomática por muitos anos, sendo identificada, acidentalmente, durante exame radiográfico de rotina.

 

Imagem clínica do cisto do ducto nasopalatino

Figura 1- Imagem clínica mostrando tumefação.

 

Características radiológicas

O cisto ocorre na porção mediana anterior do palato, mas pode também está localizado entre as raízes dos incisivos superiores. Nesses casos, ele pode causar divergência das raízes. A lesão é radiolúcida, com limites definidos e pode ser ovoide (Figura 2), em formato de pera ou coração (Figura 3). O formato em coração deve-se, principalmente, a projeção da espinha nasal anterior sobre a imagem da lesão. Em alguns casos, pode ser encontrada a reabsorção das raízes. Sendo assim, o exame de tomografia computadorizada pode ser útil para avaliar a extensão nasal da lesão, suas dimensões e sua localização no canal (Figura 4).

Como o cisto ocorre no interior do canal incisivo, o seu diagnóstico diferencial com a fossa incisiva aumentada é importante. Muitos estudos propuseram diferentes limites de tamanho para essa diferenciação, mas com resultados discordantes. Por esse motivo, a melhor escolha é fazer o acompanhamento clínico e radiográfico quando o paciente não apresentar sinais e sintomas sugestivos de alteração patológica.

 

Imagem radiográfica do cisto do ducto nasopalatino

Figura 2- Exame radiográfico da lesão clínica mostrada na figura 1. Note a imagem radiolúcida, ovoide e com limites bem definidos.

 

Imagem radiográfica em "coração" do cisto do ducto nasopalatino

Figura 3- O cisto do ducto nasopalatino pode mostrar imagem radiolúcida no formato de coração.

 

Corte sagital de tomografia computadoriazada mostrando cisto do ducto nasopalatino interior do canal nasopalatino

Figura 4- Corte sagital de tomografia computadorizada mostrando lesão hipodensa com limites bem definidos e localizada no interior do canal nasopalatino.

 

Características histopatológicas

O quadro histopatológico do cisto do ducto nasopalatino mostra cavidade cística revestida por um epitélio de aparência variável, podendo apresentar um (ou mais) dos seguintes tipos: estratificado pavimentoso não queratinizado, pseudoestritificado, colunar ou cuboidal (Figura 5). Quando o epitélio é pseudoestratificado, células caliciformes podem ser visualizadas.

Em razão de sua localização no interior do canal, frequentemente, feixes vásculo-nervosos proeminentes são encontrados na cápsula da lesão. Conforme mencionado anteriormente, o cisto pode ser bilateral e, em alguns casos, é possível encontrar remanescentes epiteliais em sua parede. Processo inflamatório secundário de intensidade variável é também observado. Casos raros com presença de cartilagem ou pigmentação melânica são relatados na literatura.

 

Imagem histopatológica do cisto do ducto nasopalatino

Figura 5- Corte histopatológico do cisto do ducto nasopalatino mostrando epitélio pseudoestratificado ciliado.

 

Tratamento

O tratamento do cisto do ducto nasopalatino é a enucleação cirúrgica, sendo o prognóstico excelente. Não são raros os casos de pacientes com fossa incisiva aumentada, diagnosticados erroneamente como cisto do ducto nasopalatino, que são  submetidos a procedimentos cirúrgicos desnecessários.

 

Leitura Complementar

1- Cavalcante IL, Barros CCS, Cunha JLS, Cruz VMS, Pedrosa GA, Santos AJ, et al. Clinicopathologic features of nasopalatine duct cysts: A retrospective study in two Brazilian oral and maxillofacial pathology referral centers. Med Oral Patol Oral Cir Bucal 2021;26:e676-e683.

2-Grossmann SM, Machado VC, Xavier GM, Moura MD, Gomez RS, Aguiar MCF, et al. Demographic profile of odontogenic and selected nonodontogenic cysts in a Brazilian population. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2007;104:e35-41.

3- Lake S, Iwanaga J, Kikuta S, Oskouian RJ, Loukas M, Shane T. The incisive Canal: A Comprehensive Review. Cureus 2018;10:e.3069.

4- Shear M, Speight PM. Cysts of the Oral and Maxillofacial Regions. Blackwell:Oxford, 2007, 4 ed.

5- Vasconcelos R, Aguiar MF, Castro W, Araújo VC, Mesquita R. Retrospective analysis of 31 cases of nasopalatine duct cyst. Oral Dis. 2008;5:325-358.

 

 

Consultório

blank

Conheça nossos cursos

blank