O eritema multiforme é uma doença bolhosa, descamativa, aguda, imunomediada e que pode afetar as mucosas e a pele. Os eventos que precipitam o surgimento dessas lesões incluem infecção prévia pelo vírus do herpes simples, por Mycoplasma pneumoniae, vírus da hepatite C ou quando há reação de hipersensibilidade a medicamentos. Entre os medicamentos mais relacionados com a doença, citamos: alopurinol, carbamazepina, barbitúricos, antibióticos, contraceptivos, codeína, busulfan, anti-inflamatórios não esteroides, sulfonamidas, inibidores de protease, derivados de sulfa, verapamil, dentre outros. Além disso, encontramos, ainda, alguns casos que são associados a outros agentes bacterianos, virais, inclusive o SARS-CoV-2, fúngicos ou parasitários.

 

Características clínicas

As lesões orais do eritema multiforme se manifestam como áreas eritematosas, bolhosas ou descamativas, com formação de úlceras rasas, bastante dolorosas, que se distribuem principalmente sobre a mucosa não queratinizada. Na maioria das vezes, a gengiva e o palato duro não são afetados. Lesões crostosas e de conteúdo hemorrágico são encontradas no lábio, na transição com a pele. O paciente pode apresentar desidratação, em razão da dificuldade de ingestão de líquidos.

Basicamente, o eritema multiforme pode apresentar duas formas clínicas: a menor e a maior. No que se refere à forma menor, somente uma mucosa é afetada e, em geral, a mucosa oral é a mais atingida. As lesões surgem, repentinamente, afetando, sobretudo, adultos abaixo dos 50 anos de idade. Na fase inicial, o paciente pode apresentar febre, mal-estar, tosse e dor de garganta. Lesões de pele, quando presentes, são mais discretas e afetam principalmente a região das extremidades.

No que se refere à forma maior, sabe-se que duas ou mais mucosas devem estar afetadas. Sendo assim, além da mucosa oral, a mucosa geniturinária, esofagiana, ocular, nasal e conjuntival podem ser envolvidas, em conjunto com as lesões de pele. Quando há envolvimento ocular, o diagnóstico diferencial com penfigoide cicatricial deve ser realizado.

Cabe mencionar ainda que as lesões de pele podem se expressar de diferentes formas, exibindo placas (ou máculas eritematosas) concêntricas e arredondadas. Tais lesões (em alvo) são bastante sugestivas do diagnóstico e podem exibir, na região central, a formação de vesículas ou úlceras, nos casos mais severos.

 

eritema multiforme

 

Figura 1 – Lesões descamativas, ulceradas, rasas, com formação de crostas hemorrágicas no lábio, em um paciente com eritema multiforme (Cortesia da Prof. Aline Cruz).

 

No passado, a síndrome de Stevens-Johnson e a necrose epidérmica tóxica eram consideradas formas clínicas mais severas de eritema multiforme. Entretanto, na atualidade, estas formas são reconhecidas como entidades diferentes, apesar de apresentarem algumas semelhanças clínicas e imunopatológicas. Ambas estão mais associadas com medicamentos, diferente do eritema multiforme. Vale ressaltar que, o grau de envolvimento na pele é uma das características que distinguem a síndrome de Stevens-Johnson da necrose epidérmica tóxica. Nessa última, as lesões de pele lembram aquelas de pacientes vitimados por queimaduras.

 

Características histológicas

No exame histopatológico de uma biópsia perilesional do eritema multiforme, podemos encontrar fendas sub ou intraepiteliais, associadas com necrose das células epiteliais basais. Além disso, o infiltrado inflamatório misto, incluindo eosinófilos, é também encontrado, por vezes, em disposição perivascular. Embora o exame de imunofluorescência seja negativo, depósitos inespecíficos de imunoglobulinas podem ser eventualmente observados. Esse método pode ser bastante útil para os casos em que for necessário fazer o diagnóstico diferencial com outras condições imunomediadas descamativas que afetam a mucosa oral.

 

Tratamento

Como os achados laboratoriais são inespecíficos, o diagnóstico é, geralmente, realizado, tomando por base os achados clínicos. Nesse processo, deve-se observar o surgimento repentino de lesões, a sua predileção por mucosa não queratinizada, a presença das lesões crostosas hemorrágicas no lábio, a natureza pleomórfica das lesões nas mucosas e pele, entre outras características. Como alguns casos podem estar associados com o uso de medicamentos, a anamnese criteriosa é muito importante para a identificação do agente causal.

Para os casos leves de eritema multiforme, nenhum tratamento ou apenas o uso de corticoide tópico são indicados. Quando as lesões provocam acentuada morbidade, o tratamento envolve, principalmente, a corticoterapia. Nela, corticosteroides são administrados por via oral (0.5-1.0 mg/kg por dia), entre 7 a 10 dias, conforme a evolução clínica do paciente. Para os casos mais severos, o uso endovenoso pode ser necessário. Para lesões recorrentes e associadas com reativação do vírus do herpes simples, o uso de aciclovir profilático é defendido por alguns autores. É importante destacar que a infecção por esse vírus é o principal fator etiológico do eritema multiforme recorrente.

 

Leitura complementar:

1- Du Y, Wang F, Liu T, Jin X, Zhao H, Chen Q, Zeng X. Recurrent oral erythema multiforme: a case series report and review of the literature. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol 2020;129:e224-e229.

2- Neville BW, Damm DD, Allen CM, Chi AC. Oral and Maxillofacial Pathology. Elsevier, St. Louis, 4ed, 2016.

3- Sanchis J, Bagán J, Gavaldá G, Murillo J, Diaz JM. Erythema multiforme: diagnosis, clinical manifestations and treatment in a retrospective study of 22 patients. J Oral Pathol Med 2010;39:747-752.

 

 

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