O carcinoma mucoepidermoide é o tumor maligno de glândula salivar mais comum, compreendendo de 5 a 10% de todos os tumores desse grupo. Metade dos casos ocorre nas glândulas salivares maiores, principalmente a parótida. Depois do adenoma pleomórifico, esta é a segunda neoplasia de glândula salivar menor mais comum. Ele acomete pacientes de uma ampla faixa etária. Seu principal sítio de ocorrência na boca é o palato, seguido da mucosa jugal. Em razão da presença de muco no interior da lesão, o tumor pode apresentar coloração azulada. Esse achado está relacionado com o efeito Tyndall (Convido você, caro leitor, a fazer uma leitura do nosso post sobre o efeito Tyndall no diagnóstico de doenças bucais). Casos raros, intraósseos, são descritos e podem mostrar semelhança microscópica com o cisto odontogênico glandular.
Figura 1- Lesão tumoral no palato, exibindo coloração azulada em razão do efeito Tyndall.
Figura 2- Imagem radiográfica mostrando erosão óssea na região retromolar do dente 47. A região retromolar é também uma importante localização dessa lesão.
O evento mais importante dentro da patogenia molecular do carcinoma mucoepidermoide é a translocação entre os genes CRTC1 e MAML2. Essa alteração é mais prevalente nos tumores de grau baixo e intermediário de malignidade. Ela pode ser identificada por FISH (método de hibridização in situ fluorescente) ou com ensaios de transcrição reversa, seguida da reação de cadeia da polimerase (RT-PCR) (Confira o painel de marcadores moleculares para o diagnóstico de neoplasias de glândula salivar).
Características histopatológicas
Desde a primeira descrição, três tipos celulares foram descritos no carcinoma mucoepidermoide: epidermoide, intermediária e células mucoides. Esses tipos celulares encontram-se arranjados em lençóis sólidos ou em áreas císticas. Embora as células intermediárias sejam predominantes, as células mucosas e epidermoides são identificadas mais facilmente. Histologicamente, as células intermediárias podem ser basaloides, ovoides ou poligonais, com citoplasma claro. Contudo, células claras e oncocíticas também podem ser encontradas.
O carcinoma mucoepidermoide vem sendo classificado em graus de malignidade (baixo, intermediário e alto). Os tumores de baixo grau apresentam maiores proporções de células mucoides e de áreas cística. Os espaços císticos são revestidos por células mucoides, contendo núcleos periféricos, que coram-se positivo para o PAS, com ou sem diástase. Enquanto, os tumores intermediários apresentam áreas mais sólidas, as lesões de alto grau mostram também poucas células mucoides, exibem áreas de pleomorfismo, figuras de mitose, invasão perineural e de osso, bem como necrose. Existem vários sistemas de gradação e alguns utilizam escores para os diferentes componentes do tumor. É importante destacar que os tumores de grau baixo e intermediário apresentam melhor prognóstico. O exame de imunohistoquímica pode contribuir para o diagnóstico. O tumor é positivo para p40, p63 e CK7 e negativo para as proteínas SOX10 e S100. A positividade intensa para CK7 ajuda no diagnóstico diferencial com o carcinoma de células escamosas. Embora o carcinoma mucoepidermoide seja negativo para marcadores mioepiteliais, a positividade para o p63 deve-se ao fenótipo do ducto estriado, estrutura que ele tenta reproduzir, e que apresenta células basais positivas para p63. A proteína EGFR é positiva nos tumores de alto grau de malignidade.
Figura 3- Imagem microscópico de um carcinoma mucoepidermoide de baixo grau de malignida. Notar a presença de áreas císticas revestida por células mucoides (seta), células intermediárias e epidermoides. (Imagem gentilmente cedida pelo Prof. Felipe Paiva Fonseca, UFMG).
Tratamento
O tratamento para carcinoma mucoepidermoide é principalmente cirúrgico. A radioterapia e ressecção de linfonodos regionais são usualmente indicadas para os casos de alto grau de malignidade. O prognóstico é pior nos tumores em estágio avançados e de alto grau de malignidade, que não apresentam a translocação CRTC1-MAML2, com margens cirúrgicas comprometidas.
Efeito Tyndall e coloração azul do carcinoma mucoepidermoide!
Leitura Complementar:
1- Fonseca FP, Carvalho MV, Almeida OP, Rangel AL, Takizawa MCH, Bueno AG, Vargas PA. Clinicopathologic analysis of 493 cases of salivar gland tumors in a Southern Brazilian population. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol 2012;114:230-239.
2- Hellquist H, Skalova A. Histopathology of the Salivary Gland. Springer:Heidelberg, 1ed, 2014.
3- Pires FR, Pringle GA, Almeida OP, Chen S. Introral salivar gland tumors: A clinicopathological study of 546 cases. Oral Oncol 2007;43:463-470.
4- Regezi JA, Sciubba JJ, Jordan RCK. Oral Pathology: Clinical Pathologic Correlations. Elsevier, 7 ed, 2017.
5- Simpson R, Palma S. Selected recent advances in the pathology of salivary neoplasms. Diag Histopathol 2010;16:276-286.
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