O cisto dentígero é o tipo mais frequente entre os cistos de origem odontogênica. Ele representa cerca de 17% a 25% dos processos patológicos císticos dos ossos maxilares, podendo ser formar a partir de alterações de desenvolvimento durante a odontogênese ou de eventos inflamatórios. A formação do cisto pode ocorrer nos estágios iniciais da formação da coroa dentária, quando há degeneração das células do retículo estrelado e o subsequente acúmulo de fluido na região. Nesse caso, o dente envolvido apresenta hipoplasia de esmalte. O cisto pode se formar também após a formação completa da coroa dentária, quando há acúmulo de fluido entre a coroa e o epitélio reduzido do órgão do esmalte. Nessa situação, o dente afetado não apresenta hipoplasia de esmalte.
A origem inflamatória do cisto dentígero surge em razão do estímulo inflamatório proveniente da necrose pulpar do dente decíduo predecessor. Embora classificado como cisto odontogênico de desenvolvimento, a origem inflamatória deve ser considerada principalmente nos casos de lesões na região de pré-molares inferiores. Independente dos mecanismos iniciais de formação, desenvolvimento ou inflamatório, uma vez que é formada a cavidade, as células descamadas aumentam a pressão osmótica interna, atraindo o líquido do meio intersticial para a cavidade, elevando, assim, a pressão hidrostática. Esta por sua vez, promove a expansão do cisto, com consequente reabsorção do osso adjacente.
Características clínicas
Clinicamente, o cisto dentígero afeta adultos jovens, entre a segunda e terceira década de vida, sendo, mais frequente em homens. Os terceiros molares mandibulares impactados são os dentes mais afetados, seguidos pelos caninos superiores e segundos pré-molares inferiores. Contudo, é raro o desenvolvimento de cisto dentígero associado a dentes decíduos.
Características radiológicas
Geralmente, essa lesão é assintomática, sendo diagnosticada em achados radiográficos ocasionais, nos quais são observados radiolucência unilocular bem delimitada. Essa área radiolúcida apresenta o clássico padrão central, em que a coroa é completamente projetada para o interior da radiolucidez e se liga à junção amelocementária do dente afetado. Algumas vezes, o cisto pode desenvolver-se lateralmente, englobando a porção da coroa e raízes dentárias (Figura 1). Além disso, pode ocorrer a reabsorção radicular dos dentes adjacentes erupcionados, bem como o deslocamento do dente afetado ou de germes dentários próximos. No entanto, é válido ressaltar que cistos dentígeros de grandes dimensões são incomuns e, nesses casos, o ceratocisto odontogênico e o ameloblastoma, uni ou multicístico, devem ser considerados no diagnóstico clínico diferencial. É importante mencionar que um espécime da área representativa da lesão deve ser removido para investigação histopatológica. A distinção entre um pequeno cisto dentígero de um folículo dentário espessado é feita pela presença de área cística no primeiro.
Figura 1- Imagem radiográfica do cisto dentígero possivelmente relacionado à mortificação pulpar do dente decíduo. Observe que os limites da lesão são bem definidos.
Punção aspirativa
Na punção aspirativa do cisto dentígero encontraremos um líquido de coloração amarelada, podendo apresentar também algum conteúdo hemorrágico (Figura 2).
Figura 2- Líquido de coloração amarelada-sanguinolento obtido após a punção aspirativa do cisto dentígero. Esse procedimento é sempre indicado de ser realizada previamente a biópsia da lesão.
Características histopatológicas
O revestimento do cisto dentígero é formado por um epitélio escamoso estratificado não queratinizado, que circunda um tecido conjuntivo fibroso ou fibromixoide (Figura 3). Áreas de hiperplasia são comumente encontradas na lesão. É importante destacar que esse revestimento também pode ser encontrado em um folículo pericoronário normal. Em alguns casos, o epitélio de revestimento dessa lesão pode sofrer diferenciação metaplásica e exibir células ciliadas e mucosecretoras. Nos casos em que essas alterações são marcantes, o cisto odontogênico glandular deve ser considerado como diagnóstico histopatológico diferencial.
Figura 3- O revestimento epitelial do cisto dentígero é formado por epitélio estratificado pavimentoso não queratinizado.
Tratamento
A enucleação, em conjunto ou não com a remoção do dente afetado, é o tratamento sugerido para cistos dentígeros menores. As Lesões extensas devem ser marsupializadas, visando reduzir o defeito ósseo produzido pelo cisto. Após a regressão da lesão, a cápsula cística remanescente deve ser enucleada para uma análise histopatológica completa, a fim de descartar os outros possíveis diagnósticos diferenciais. A decisão sobre a preservação do dente afetado depende, dentre outros fatores, do diagnóstico histopatológico final e da possibilidade de tracionamento do mesmo. Com excelente prognóstico, após a remoção completa da lesão, a recidiva do cisto dentígero é rara. De igual modo, em raríssimos casos, pode ocorrer transformação neoplásica do cisto dentígero para ameloblastoma ou tumores malignos, sendo necessário, o acompanhamento do paciente após o tratamento.
Leitura Complementar:
1- Al-Talabani NG, Smith CJ. Experimental dentigerous cysts and enamel hypoplasia: their possible significance in explaining the pathogenesis of human dentigerous cysts. J Oral Pathol 1980;9:82-91.
2- Austin RP, Nelson BL. Sine Qua Non: Dentigerous Cyst. Head Neck Pathol. 2021 [published online ahead of print].
3- Bodner L, Manor E, Shear M, van der Waal I. Primary intraosseous squamous cell carcinoma arising in an odontogenic cyst: a clinicopathologic analysis of 116 reported cases. J Oral Pathol Med 2011; 40:733-8.
4- Daley TD, Wysocki GP. The small dentigerous cyst. A diagnostic dilemma. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 1995; 79:77-81.
5- Makkar V, Kamboj M, Narwal A. Convolutions of dentigerous cyst: An institutional experience. J Exp Ther Oncol 2019;13:65-70.
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