A rânula é um termo utilizado para definir o cisto de extravasamento de muco, que ocorre no assoalho bucal. O termo é derivado da palavra rana, em latim, que significa rã. A similaridade clínica dessa lesão com a barriga de uma rã justifica essa associação.
Etiologia
A rânula se forma pelo acúmulo de muco ocasionado por obstrução ou trauma, levando ao extravasamento desse material para o tecido conjuntivo. Geralmente, a glândula sublingual é a mais afetada, porque apresenta secreção contínua. Isso faz com que, diante de um evento traumático ou obstrutivo, o cisto se forme rapidamente.
A anatomia da glândula sublingual é complexa. Ela é formada por várias glândulas, em especial do tipo mucosas, e se comunicam com a prega sublingual por meio de 8 a 20 ductos, chamados de Rivinus. Em alguns indivíduos, identificamos a presença de um ducto maior, denominado de Bartholin, que desemboca juntamente com o ducto excretor da submandibular na carúncula sublingual.
Características clínicas
Como mencionado anteriormente, a glândula sublingual é a mais afetada pela rânula, acometendo preferencialmente os pacientes jovens. Diferente do cisto dermoide e epidermoide, que ocorrem na linha mediana, a rânula se localiza na porção lateral. Clinicamente, observamos aumento de volume arredondado na região, de coloração azulada em razão do efeito Tyndall (clique aqui para conhecer um pouco mais sobre esse fenômeno físico e as suas implicações no diagnóstico oral) (Figura 1). Tal como na mucocele, as lesões podem apresentar surtos de diminuição e recrudescimento.
Quando a rânula se estende através do músculo milo-hioide, ela produz aumento de volume no pescoço, sendo denominada de rânula mergulhante (Figura 2). Esse envolvimento da região cervical pode estar relacionado a algum defeito de descontinuidade do músculo milo-hioide ou devido à localização ectópica da glândula sublingual. Para o diagnóstico, exames de imagens podem ser necessários. Na tomografia computadorizada ou no exame de ressonância magnética, o “sinal em cauda” pode ser observado, representando a extensão da lesão do espaço sublingual até o submandibular (Figura 3). Esse achado imaginológico pode ajudar no diagnóstico diferencial de rânula mergulhante com o higroma cístico, cisto do ducto tireoglosso, cisto da fenda branquial e cisto dermoide/epidermoide.
Figura 1- Aspecto clínico da rânula. Observar lesão de coloração azulada e arredondada no assoalho bucal.
Figura 2- Rânula mergulhante.
Figura 3- Exame de tomografia computadorizada referente ao paciente da figura 2, mostrando o “sinal em cauda” (seta vermelha), característico da rânula mergulhante.
Características histopatológicas
No exame microscópico, observamos o muco extravasado, envolvido por reação de granulação, além da presença de macrófagos fagocitando muco (células mucífagas).
Tratamento
Embora a remoção da glândula sublingual afetada seja o tratamento mais eficaz, ela está associada à maior morbidade, incluindo, ainda, o risco de dano ao nervo lingual ou do ducto da glândula submandibular (ducto de Wharton). Quando a glândula é removida, não é necessário fazer a enucleação total da parede de revestimento da lesão, mesmo quando há ocorrência de rânula mergulhante. Alguns profissionais preferem procedimentos mais conservadores, o que inclui a marsupialização, com ou sem fechamento com gaze por 7 dias, ou a remoção parcial da glândula sublingual. A experiência do cirurgião e a extensão da lesão, dentre outros fatores, devem ser levados em consideração para a escolha da melhor abordagem.
Leitura complementar:
1- Carlson EC & Ord RA. Salivary Gland Pathology. Diagnosis and Management. Wiley Blackwell, Hoboken, 3ed, 2022.
2- Chung YS, Cho Y, Kim BH. Comparison of outcomes of treatment of ranula: a proportion meta-analysis. B J Oral Maxillofac Surg 2019;57:620-626.
3- McGurk M, Eyeson J, Thomas B, Harrison JD. Conservative treatment of oral ranula by excision with minimal excision of the sublingual gland: Histologic support for a traumatic etiology. J Oral Maxillofac Surg 2008;66:2050-2057.
4- Neville BW, Damm DD, Allen CM, Chi AC. Oral and Maxillofacial Pathology. Elsevier, St. Louis, 4ed, 2015.
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