Autora:

Prof. Carolina Cavaliéri Gomes        e-mail: carolinacgomes@ufmg.br

 

O conceito de que as neoplasias são monoclonais (ou clonais), embora amplamente incorporado pela literatura, deve ser reinterpretado à luz das evidências atuais. Este conceito suporta a ideia de que a massa tumoral é resultado da expansão clonal de uma célula progenitora única que sofreu alterações genéticas. No entanto, a monoclonalidade dos tumores é muito questionável e hoje as evidências apontam para uma origem policlonal de muitos tumores sólidos.

Se os danos genéticos envolvidos na iniciação da carcinogênese são em grande parte devido a fatores ambientais, tais como contato com substâncias químicas, efeitos da radiação, infecção viral, não parece altamente improvável que apenas uma célula única sofra alterações genéticas?

A maior parte dos estudos e livros textos falam de clonalidade das neoplasias com base apenas em técnicas ligadas a marcadores polimórficos do cromossomo X e ignoram completamente o viés produzido pelo tamanho do campo clonal em cada tecido/órgão. As mulheres são mosaicos que apresentam em cada célula/campo clonal apenas um cromossomo X ativo (e o outro inativo). Nem sempre a monotipia (homozigose para um determinado marcador polimórifico) tumoral pode ser interpretada como monoclonalidade, uma vez que dentro de um mesmo campo clonal já haveria esta monotipia para marcadores polimórficos do cromossomo X. Ao contrário, uma heterotipia em um dado marcador polimórfico do cromossomo X no DNA tumoral pode ser interpretada como policlonalidade, uma vez que ele indica que há pelo menos dois grupos de células participando da formação deste tumor
(ver ilustração). Assim, torna-se inaceitável nos dias de hoje a perpetuação de um conceito cercado por tantos questionamentos e evidências científicas frágeis.

Até que se prove o contrário, alguns tumores podem ser monoclonais em origem, mas vários tumores já tem sua origem policlonal comprovada. Na era da medicina personalizada, o estabelecimento da origem clonal dos tumores é crucial, uma vez que pode interferir diretamente no tratamento destas lesões.

 

Leitura Complementar:

1- Gomes CC, Gomez RS. Interpretation of clonality and X-chromosome inactivation assays urge attention. J Clin Pathol. 2011 Nov 22. [Epub ahead of print] No abstract available.

2- Parsons BL. Many different tumor types have polyclonal tumor origin: evidence and implications. Mutat Res 2008;659:232–47.