Também denominado como “cisto periapical”, o cisto radicular é o mais frequente cisto odontogênico de origem inflamatória. O estímulo inflamatório crônico proveniente do tecido pulpar necrosado promove a proliferação das células epiteliais localizadas no ápice radicular, remanescentes epiteliais de Malassez. Esses remanescentes epiteliais são derivados da bainha epitelial de Hertwig. O cisto radicular se desenvolve enquanto o quadro inflamatório crônico persiste. Na medida em que ocorre a proliferação epitelial, as células epiteliais centrais sofrem necrose por falta de nutrientes, formando uma cavidade com conteúdo fluido em seu interior. O conteúdo proteico do fluido é aumentado conforme as células epiteliais se descamam para o interior do lúmen cístico. Na tentativa de equilibrar a pressão osmótica, há entrada de líquido para o lúmen, resultando no crescimento do cisto, que de forma lenta, pressiona e reabsorve o tecido ósseo circunjacente. É importante ressaltar que o mecanismo de crescimento do cisto radicular é semelhante ao do cisto dentígero, ambos impulsionados pela pressão osmótica e hidrostática aumentadas no interior da cavidade cística.

 

Características clínicas 

Clinicamente, o cisto radicular é geralmente assintomático e está relacionado a um dente desvitalizado. Ele é mais frequente em adultos, mas também pode se desenvolver na dentição decídua, usualmente associada aos molares inferiores. Cistos radiculares maiores podem causar dor, aumento de volume, mobilidade e deslocamento do dente afetado e dos dentes adjacentes.

 

Características radiológicas

A radiolucidez arredondada, bem delimitada, localizada na região apical de um dente não vital é a principal apresentação radiográfica do cisto radicular (Figuras 1 e 2). Vale mencionar que a desvitalização pulpar também pode resultar na formação do granuloma periapical, processo inflamatório, e que deve ser considerado no diagnóstico diferencial clínico-radiográfico. Embora lesões maiores geralmente sejam cistos, é necessária à análise histopatológica para a distinção entre as duas entidades. Em alguns casos, o cisto radicular pode desenvolver na porção lateral da raiz dentária, apresentando aspecto radiográfico semelhante ao cisto periodontal lateral. Como este último não está relacionado à necrose da polpa dentária, os dentes geralmente mostram resposta positiva aos testes de vitalidade pulpar. O diagnóstico de cisto radicular ou periodontal lateral pode ser confirmado através do exame microscópico.

Acrescente-se, ainda, que quando o dente associado a um cisto radicular é extraído e a curetagem da cápsula cística não é realizada, essa lesão pode permanecer e ser observada posteriormente como uma lesão radiolúcida bem delimitada, localizada na região em que o ápice radicular era previamente encontrado. Nesses casos, a lesão recebe o nome de “cisto residual”.

 

Imagem radiográfica do cisto radicular

Figura 1- Área radiolúcida de limites bem definidos associada ao incisivo lateral superior esquerdo.

 

Imagem radiográfica do cisto radicular

Figura 2- Imagem radiográfica do cisto radicular associado a raiz do dente pré-molar. Nota os limites bem definidos da lesão.

 

Punção aspirativa

Durante a punção aspirativa do cisto radicular pode ser observada a presença de líquido de cor amarelo citrino e brilhante (Figura 3).

 

Imagem da punção aspirativa do cisto radicular

Figura 3- Líquido amarelo citrino obtido durante a punção aspirativa do cisto radicular mostrado na figura 1.

 

Características histopatológicas

O cisto radicular é caracterizado microscopicamente por uma cápsula cística de tecido conjuntivo fibroso denso, revestida por epitélio escamoso estratificado, não queratinizado e hiperplasiado (Figura 4). Esse revestimento epitelial não é observado nos granulomas periapicais e, portanto, é considerado como o principal critério histopatológico para a distinção entre as duas doenças. Assim como nas ocorrências de cisto dentígero, as células epiteliais do revestimento podem sofrer alterações prosoplásicas e se diferenciarem em células mucosas e ciliadas. Quando isso ocorre, o quadro histopatológico do cisto radicular pode se assemelhar ao observado nos cistos odontogênicos glandular. O epitélio de revestimento do cisto também pode exibir formação estruturas hialinas denominadas de “corpúsculos de Rushton”. Raramente são encontradas áreas de displasia no revestimento epitelial . Calcificações distróficas, cristais de colesterol e depósitos de hemossiderina podem ser vistos tanto na cápsula de tecido conjuntivo quanto no lúmen cístico. O cisto radicular apresenta infiltrado inflamatório de natureza e intensidade variáveis na cápsula.

 

Imagem microscópica do cisto radicular

Figura 4- No exame microscópico do cisto radicular geralmente encontramos epitélio do tipo estratificado pavimentoso não queratinizado hiperplasiado.

 

Tratamento

Na punção aspirativa do cisto radicular podemos observar a presença de líquido de coloração amarelo citrino (Figura 2). O tratamento endodôntico deve ser empregado nas lesões que apresentarem quadro clínico-imaginonológico sugestivo de cisto ou granuloma periapical. Nos casos em que não há redução da radiolucidez, após o tratamento conservador, a cirurgia periapical pode ser considerada. O manejo de cistos radiculares de maiores dimensões pode ser feito pela combinação entre o tratamento endodôntico e a descompressão. A enucleação do remanescente cístico pode ser posteriormente realizada. A recidiva do cisto radicular após o manejo terapêutico adequado é rara e um bom prognóstico é esperado. A transformação maligna do cisto radicular é extremamente rara.

 

Leitura Complementar:

1- Couto AMD, Meirelles DP, Valeriano AT, Almeida DS, Moraes Ê, Tarquinio SBC, Batista AC, Mendonça EF, Costa NDL, Alves PM, Nonaka CFW, Abreu LG, Aguiar MCF. Chronic inflammatory periapical diseases: a Brazilian multicenter study of 10,381 cases and literature review. Braz Oral Res 2021; 15:e033.

2- Alotaibi O, Alswayyed S, Alshagroud R, AlSheddi M. Evaluation of concordance between clinical and histopathological diagnoses in periapical lesions of endodontic origin. J Dent Sci 2020; 15:132-135.

3- Tsesis I, Rosen E, Dubinsky L, Buchner A, Vered M. Metaplastic changes in the epithelium of radicular cysts: A series of 711 cases. J Clin Exp Dent 2016;8:e529-e533.

4- Chen JH, Tseng CH, Wang WC, Chen CY, Chuang FH, Chen YK. Clinicopathological analysis of 232 radicular cysts of the jawbone in a population of southern Taiwanese patients. Kaohsiung J Med Sci 2018;34:249-254.

5- Bodner L, Manor E, Shear M, van der Waal I. Primary intraosseous squamous cell carcinoma arising in an odontogenic cyst: a clinicopathologic analysis of 116 reported cases. J Oral Pathol Med 2011; 40:733-738.

 

 

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